MEDIAÇÃO PENAL COMO ALTERNATIVA DE COMBATE A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA


Que a nossa sociedade ainda é predominantemente ligada à cultura patriarcal não há como negar, prevalecendo ainda a ideia de virilidade à honra masculina, o que de fato provoca incômodos a sociedade feminista que vem desencadeando uma luta diária em prol da igualdade social, econômica, e política.
Deste modo, o embate quanto a igualdade de gênero vai em contramão ao pensamento machista  acarretando diversas situações conflitantes e que muitas vezes podem gerar agressões, verbais, físicas e até fatais.
A mídia noticia a todo o momento, casos de violência doméstica contra a mulher revoltando grande parte da população, neste sentido há diversos questionamentos, tais como, o que fazer para proteger a vítima?, como expor de forma translucida que o acesso a Justiça é para todos?, que o Estado protege quem sofre essas violências?, Existe outros meios de solucionar esses conflitos?.
Pois bem, é isso que trata-se o presente trabalho. O âmbito Jurisdicional vem como meio de tutelar a proteção ao indivíduo vitimizado, e, por muito tempo acreditava-se que somente o Estado tinha a capacidade de findar o crime de violência doméstica.
Sabe-se que a recente Lei nº 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, tem como função coibir a violência doméstica e familiar contra mulher em estado de vulnerabilidade e abarca as punições para quem pratica tal crime, e, as varas criminais lotam com demandas desse parâmetro. 
Consoante o Panorama da violência contra as mulheres no Brasil, fornecido pelo Senado, que nos anos de 2015 houve uma redução das taxas de homicídios para 4,4 homicídios por grupo de 100 mil mulheres, com relação ao ano anterior de 2014 que foram registrados 4,6 homicídios por grupo de 100 mil mulheres, in verbis:
Tabela ilustrativa, disponível www.senado.gov.br

Em tese, a problemática do destrinchar a proteção da mulher, está enraizada na dificuldade em que estas têm de se reconhecerem como vítimas, uma vez terem sido educadas para serem submissas ao parceiro e não possuírem sequer um grau de instrução para manterem sua subsistência independente do cônjuge.
Porém, todo o enredo familiar de agressões verbais e físicas à mulher, transformam-se em um ciclo vicioso não somente na díade do casal, mas influenciando os próprios filhos a desenvolverem comportamentos disfuncionais.
Neste sentido, é correto afirmar que a tradição Jurídica do Direito é ingressar em Litígio, ou seja, fazer-se munir do âmbito Jurisdicional para solucionar as lides. Para José Luis de Morais o conflito trata-se de:
O conflito é inevitável e salutar (especialmente se queremos chamar a sociedade na qual se insere de democrática); o importante é encontrar meios autônomos de manejá-lo fugindo da ideia de que seja um fenômeno patológico e encarando-o como um fato, um evento fisiológico importante, positivo ou negativo, conforme os valores inseridos no contexto social analisado. MORAIS, 2008. p. 47.
Todavia, com o avançar do tempo, assim como a evolução humana referente ao conhecimento não somente de seus direitos individuais, mas coletivos também, começou-se a vislumbrar outros meios de pacificação social, o que chamamos de “desjudicialização”.
A “desjudicialização”, nada mais é que o meio de solucionar conflitos sem a necessidade de acionar a esfera Judicial, e, a mediação faz parte desse rol de processos alternativos capazes de dissolver questões que em determinadas situações seriam impetradas litigiosamente.
Para a Professora Ana Lucia Prado Cantão, a mediação é uma das formas mais antigas de resolução de conflitos, se não vejamos:
Diz-se que a Mediação de Conflitos, mesmo que ainda não denominada desta maneira, é uma das formas mais antigas de resolver conflitos, tradicionalmente ligada à figura do mestre, ou do cacique. Costuma-se recorrer a algumas tradições religiosas e às culturas chinesa, japonesa, africanas, culturas indígenas, dentre outras. Nestas tradições, o mediador teria a função de dirimir conflitos pelo status que mantinha na tribo ou na comunidade. CATÃO, 2009. p. 27.
Em 2012, o Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, juntamente com a Faculdade de Direito da Fundação do Ministério Público, firmaram um Termo de Cooperação, o qual tem como intuito prestar auxílio aos conflitantes em questões familiares, mais especificamente na Vara de Violência Doméstica na Comarca da Capital. THOMÉ, 2013.  
Preliminarmente, as partes são intimadas para uma audiência na qual o Juiz apresenta qual o ensejo do Processo Penal. Nos casos de não haver nos autos do processo a medida protetiva e configurado lesão corporal, a vítima pode optar por não dar andamento ao processo criminal, e após dar vistas ao Ministério Público o processo é encerrado.
Se, porém, for identificado o registro de lesão corporal, mesmo a vitima querendo encerrar o processo, este continuará em andamento na Vara Criminal, no entanto, uma vez o Magistrado verificar a possibilidade de resolução dialogada é apresentado às partes o Projeto de Mediação para que ambos possam tentar de forma harmônica solucionar os empasses estabelecidos.
E, esse projeto vem apresentando resultados significantes, inicialmente os encontros de mediação são dirigidos por uma profissional habilitada acompanhada dos alunos da FMP que participam como ouvintes, além da presença dos conflitantes, agressor e vítima que podem ou não estarem acompanhados de advogados ou defensor público, uma vez a Lei Maria da Penha não exigir a presença de um profissional habilitado pela OAB.
Preliminarmente, o mediador recebe os conflitantes assegurando a voluntariedade de ambos e inicia-se a discussão pacífica para que possam tentar dissolver magoas pré-existentes.
Posto isto, havendo consenso é redigido um acordo de Mediação Familiar e as partes são encaminhadas à audiência na qual o Juiz verifica a vontade dos envolvidos e homologa o Termo de Mediação.
Diante disso, é importante esclarecer que o Termo de Mediação Familiar de caráter provisório é incluído nos autos, e eventualmente nos casos futuros de divórcio ou dissolução de União Estável na Vara da Família, deve ser revisto.
Neste prisma, vale ressaltar que a mediação é uma escolha na qual os conflitantes possuem a liberdade de conversarem de forma pacífica expondo os pontos divergentes, de modo, a facilitar que ambos cheguem a um denominador comum. RIBEIRO, 2015.
Outrora, cabe frisar que mesmo estando discriminado em Lei as medidas protetivas à mulher nos casos de Violência Doméstica, o Poder Judiciário não possui estrutura adequada para que os litigantes discutam as questões do conflito familiar, dessa forma a mediação torna-se a alternativa mais harmônica e humanizada visando a máxima efetividade da resolução do conflito.




REFERÊNCIAS
MORAIS, José Luis Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 47.

CATÃO, Ana Lucia Prado. Mediação e judiciário: problematizando fronteiras psi-jurídicas. 2009. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – Pontifi cia Universidade Catolica de São Paulo, São Paulo, 2009. p. 27

RIBEIRO, Andréa Tavares. Mediação penal como alternativa a processo penal em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. 2015, Disponível em: http://boletimcientifico.escola.mpu.mp.br/boletins/edicao/mediacao-penal-como alternativa-a-processo-penal-em-casos-de-violencia-domestica-e-familiar-contra-a-mulher. Acesso em: 07 de Maio de 2019.

SENADO, Panorama da violência contra as mulheres no Brasil indicadores nacionais e estaduais. 2018. Disponível em: http://www.senado.gov.br/institucional/datasenado/omv/indicadores/relatorios/BR-2018.pdf. Acesso em: 07 de Maio de 2019.

THOMÉ, Liane Maria Busnello. PANICHI, Renata Maria Dotta. MÄDCHE,Flavia Clarici. SPHOR, Maria Paula.  VARGAS, Leilaine Iara Vasques. MEDIAÇÃO FAMILIAR NA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: saber e saber fazer. Revista da Faculdade de Direito da FMP – 2013, n. 8, p. 265-273.


Comentários

Postagens mais visitadas